Apesar do título, não é do filme, (Título original: (Coming Home), lançamento: 1978 (EUA) Direção: Hal Ashby Atores: Jane Fonda, Jon Voight, Bruce Dern, Penelope Milford )que vou falar (apesar de já estar falando, e recomendando). É um outro regresso, a um outro lugar e amargo por outros motivos.
Que a situação financeiria de professores e professoras da rede pública é precária é fato sabido por todos não é novidade, mas, em tempo onde se fala em mudança e no qual a palavra reforma se tornou o hit do momento, é impossível não meter o bedelho e discutir a questão que envolve professores, alunos, pais, escola, comunidade, aprendizagem, segurança, vida.
Então... foi esta mesma necessidade de aumentar os ganhos no fim do mês para além de sobreviver com dignidade, ter o mínimo de conforto e claro, lazer, que retornei neste mês de setembro às salas de aula. 04 para ser preciso e todas no ensino fundamental, responsabilidade direta dos poderes aos quais estou diretamente ligado, estado e municipios.
Após uma primeira semana de reconhecimento, o que já foi o bastante para perceber que a vida do professor é um filme com muito mais drama que comédia, muito mais dissabores que prazeres, mais agruras que reconhecimento.
Por mótivos obvios, á escola será poupada de ser enunciada, já que não se trata apenas desta escola especifica. Em minhas andanças e conversas com professores de outras escolas, a realidade confirma ser a mesma em todos os ambientes.
Professores literalmente suspiram, aliviados por terminarem o turno ilesos, e, na mesma hora, tentam reorganizar não só mãos, cabelos e rosto sugados por uma multidão de problemas e situações nas quatro horas de trabalho braçal, reforçado pelos kilômetros andados de um lado para o outro não orientando alunos, dando-lhes explicações personalizadas, atendimento direto ou fazendo o trabalho de falar diretamente com este ou aquele, mas, separando "brigas" com e sem aspas, se aproximando deste ou daquele grupo na tentativa de que sua frágil presença intimide e reprima a desordem generalizada e assexuada que se tornou a sala de aula.
Chego a triste constatação de que trabalhamos em uma atividade vampiresca que suga nossas energias a tal ponto de, na primeira semana, já precisar de remédios para dormir e de, no mínimo, ingerir um melhoral (auto medicação) própria da cultura popular de que, um apenas, no fim do dia, relaxa os musculos e te deixa o mínimo sem tensão para poder não tratar família e nisso entende-se filhos, como se ainda estivesse na sala de aula, ou seja, num tom acima.
Passada a segunda semana, reconhecimento feito e estratégias (de guerra, paz, sobrevivência e melhoria dos níveis de convivência) definidos, vem a surpresa. A escola da TV, aquela onde se estupra, se ofende, se agride, se mata) não está tão distante, e, de um momento para outro, pode ser a que você atua, e era.
É ai que vem a famosa frase "tinha que ser comigo". e foi. Num dia de aula, aplicando avaliação ou antes, tentando fazer com que os alunos a fizessem pois, constatação também amarga, os alunos não sabem fazer o mínimo que se espera de sua posição (ocupação) que é estudar, eles não pensam. E em uma atividade avaliativa onde, pela leitura da mesma se chega às respostas, o que se via eram reclamações e chamadas de excessos. A avaliação estava "elevada demais". um reconhecimento próprio da incapacidade de raciocínio destes ou de minha incapacidade de reconhecer esta incapacidade do outro.
É neste momento que o bordão "olha a faca" escapa. Mas, infelizmente nesta hora, não era piada, não era um seriado, nem estava acontecendo na escola que só vejo pela TV, era ali, na minha frente, diante de olhos, meus e de todos os demais, tão assuatados e pasmos quanto o dos dois colegas (até então eram), meninos que até minutos atras brincavam entre si e, agora, de pé, mãos erguidas de um, sorriso quixotesco de outro e, nas mãos de um deles, em branco e vermelho (não de sangue... ainda) a faca.
Num instante infinito, onde o tempo pareceu congelar-se, vidas se passam diante de meus olhos e filmes diferentes se estampam nos demais olhares. estava acontecendo ali, naquele momento, um divisor de águas na vida de dois adolescentes, e na minha. Vítima, agressor, perturbado.
Uma mão no punho e uma ação desgraçada é impedida, mas o estrago já estava feito. Em tempo de tecnologias, ainda não se inventou a função "desfaz" para corigir eventos menores, quanto mais para este. O que se segue disso, é o torpor, a confusão, a perda de tempo e energia, o desgaste com o poder público, com a família, com as versões deste ou daquele sobre o ocorrido e dos quais vou poupá-lo(a).
Para os diretamente envolvidos, percebe-se que a ficha do que realmente ocorrera ali não caira, talvez não caia nunca. Mas, para a escola, para o professor (este que vos fala), algo fica claro. A escola é um espaço de acomodação de gente. Sim, a palavra é esta mesma, acomodação pelos motivos sociológicos mais diversos e chatos de serem debatidos mas, nem por isso, devem ser desconsiderados ou negligenciados. Essa acomodação significa aglomerado de pessoas e, infelizmente, seja em um evento popular, seja numa festa de rua, quermece, show disto ou daquilo, mas sempre aglomerado, a questão da segurança deve ser uma preocupação e a escola, como aglomerado que é, não escapa mais desta perspectiva. A ESCOLA NÃO É MAIS UM LUGAR SEGURO. para alunos e professores. A escola não significa mais para os pais tranquilidade, sabendo que, estando ali, como diziam nossos pais e mestres no passado, a criança estaria segura, livre das drogas, das más companhias, aprendendo o que se deve para serem considerados, futuramente, além de bons cidadãos, boas pessoas, formando não apenas profissionais, mas caráteres.
Sim, é uma constatação triste, mas vivida com coragem todos os dias por mim, por milhares como eu. Por homens fortes fisicamente e mulheres mostruosamente fortes em suas capacidades.
O que fica disso... a vontade de que o quadro negro (da educação) seja substituido por um quadro branco, (inclusve literalmente) onde se possa escrever uma nova história do ensino brasileiro. Onde o roteiro seja menos melodramático e mais ludico pedagógico.
E ai do(a) filho(a) da puta que revidar estas palavras revertendo a culpa para os educadores que não são "amigos dos alunos", que não "os escutam", como se fosse possível escutar alguma coisa em sala de aula e da escola, que é incapaz.
Estão mudando a educação (em Goiás), então que mudem, mas não mudem reorganziando professores visando economia e flexibilidade, não mudem desmontando um quebra-cabeças de uma só vez como um menino revoltado após não conseguir montá-lo completamente na tentativa de que, re-começando do zero, o faça melhor. Mude a educação pela perspectiva dos interesses da educação, da aprendizagem, do saber. Mude a educação por onde ela deve ser mudada, de dentro para fora. E aqui fica o convite: Senhore(a)s pensadore(a)s da educação, senhore(a)s autoridades, dententores do poder de mando (não digo aqui de mudança) senhores pais e senhoras mães... saibam o que é a escola. Saibam como é um dia neste espaço chamado de educativo e então apontem o professor e tenham a coragem de dizer que ele(a) é ou não um heroi da resistência.
Ps. os envolvidos no caso da faca já estão "normalmente" convivendo na escola. As partes envolvidas, pais, estão tomando suas posturas diante do caso o que envolve desde retrucar a escola até processos pessoais contra servidores, afinal, "tudo é culpa nossa". E eu... bem, adiantei minha consulta médica.... preciso aumentar a dosagem do medicamento.